terça-feira, janeiro 27, 2009

PRAÇA DAS NAÇÕES E MINHAS REDONDEZAS

Declarada a guerra contra a balança, ontem saí de casa pra encarar a consulta da Dra. Érika em Bonsucesso, indicação do meu mano Claudio Falcão, que já perdeu quase uma arroba nessa brincadeira de emagrecer. Mas antes passei no Engenho da Rainha pra visitar a mamãe, que andou meio barro meio tijolo, com uma bronquite braba.

Prevenido pelo Claudio que a dieta é forte, aproveitei pra filar o simples e potentoso feijão com arroz de mamãe. Um ritual de despedida temporária dos grãos que se transformam em açúcar no organismo e ajudam a incrementar minhas 8,5 arrobas. Ainda faria outro ritual de despedida, mas dessa vez, em Bonsucesso. E é pra lá que eu fui depois de sair da casa da mamãe.

Desembarquei do ônibus na Estação de Bonsucesso - não fui de trem, que no Engenho da Rainha só tem metrô - e atravessei o buraco da estação. Parte da minha rotina diária durante os dois anos que estudei na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, passar pelo buraco da estação é uma experiência inevitável para o suburbano. Um ritual de iniciação indispensável para quem é dessas bandas. Por isso considero tudo aquilo como minhas redondezas. Conheço o caminho dos becos como meu sangue conhece as ramificações de minhas artérias.

No buraco da estação, o lado esquerdo de quem entra pela rua Uranos e segue em direção a Praça das Nações é completamente tomado por ambulantes. Nessas condições, nem dá pra dizer que são ambulantes de tão fixo, de tão imóvel, de tão inexpurgável que é aquela sucessão de espeluncas comoventes. Colado na escada que sai de frente pra sapataria ELITE tem até freezer instalado pra vender sorvete.

Da velha sapataria ELITE, que junto com a SAPASSO dominava o mercado de calçados na praça, só sobrou essa loja que se vê na foto abaixo, na Cardoso de Morais, número 1. Mesmo assim, o belíssimo letreiro luminoso não existe mais. E a loja especializou-se em números grandes pra sobreviver à concorrência com DI SANTINNI, KIK CALÇADOS etc. Tenho memórias de menino nessa loja. Troço fundamental para a construção do meu caráter.


Quando eu tinha cinco anos de idade, em 1987, uma das minhas fascinações era o Rambo, e sua incrível capacidade de derrotar os inimigos das causas de bem. Pois lançaram na época um tênis do Rambo. E aquilo tornou-se meu sonho de consumo imediatemente após eu acabar de assistir o comercial do sapato na televisão. Enchi os culhões do meu pai pra ter aquele tênis.


Então ele e mamãe me fizeram trocar a chupeta que eu ainda usava pelo tênis, trato que aceitei sem pestanejar. Papai, que é o maior apaixonado por Bonsucesso que existe no mundo, me levou na sapataria ELITE onde ganhei o presente que queria. Aqui acima se vê uma foto da Praça das Nações no ano de 1987. Vai ver que um desses fusquinhas era de papai. Ele tinha um bege de placa RX 4153. Atrás da placa que se vê na foto com os nomes das ruas ficava a outra loja da sapataria ELITE, que em meados dos anos 90 acabou virando um Mc'Donalds.

Quando saí do buraco da estação eu já tinha um destino certo: o Capelinha. É ali que eu faria o outro ritual de despedida temporária. A despedida do Chopp e do Bolinho de Bacalhau. E a escolha daquele estabelecimento tem uma razão óbvia: trata-se de uma homenagem.

Meu velho avô que, antes de ir morar no Engenho da Rainha morou no Jacarezinho e em Manguinhos, frequentava assíduamente Bonsucesso. Nos últimos anos, a idade já não permitia ao vovô tanta assiduidade assim, mas nos dias de consulta com o Dr. Alexandre, cardiologista da nossa família - que atende obviamente em Bonsucesso! - o velho não dispensava uma parada no Capelinha para tomar um chope e arrematar uma porção de bolinhos de bacalhau.

Já se vão quase dois anos - o tempo passa rápido - que esse meu ancestral partiu pra melhor e eu nunca mais tinha pisado no Capelinha. A última vez foi quando eu fiquei de acompanhante de quarto quando ele ficou internado na Casa de Saúde Bonsucesso. Naquele dia, na hora do almoço, eu saí pra comer - e o velho, sistemático que só vendo, fez questão de pagar - e fui ao fiel paradeiro de meu avô. Com o telefone celular, fotografei a cena, que pude mostrar pra ele quando voltei ao quarto.

- Aqui, Vô. Fui ao Capelinha em sua homenagem.

Ele riu. Com alguma dificuldade, do alto de seus 89 anos, viu a foto e o riso lentamente tornou-se um choro, comovido. Eu tratei de falar algumas besteiras pra não chorar também. A foto daquele dia eu não tenho mais. Mas fiz questão de reproduzir, com toda cautela, essa que ficou idêntica a que mostrei pro velho no hospital. Chorei. Perguntado sobre a razão do choro, contei a história toda pra um camarada sentado ao meu lado no balcão mas todos ouviram atentamente. E depois, eu e outros velhos que também choravam com a história, erguemos todos um brinde ao velho frequentador que se foi.


Impossível não registrar uma das maiores marcas arquitetônicas de Bonsucesso. Trata-se do conjunto de edifícios de Álvaro da Costa Mello. Existem vários espalhados pelo bairro e em outros Bairros também. Alguns são residenciais, outros são comerciais. Além dos edifícios, o milionário português ergueu também o Mello Tênis Clube na praça do Carmo. Esse da foto abaixo é um residencial visto da rua Bias Fortes.


Depois de cruzar a Bias Fortes foi só atravessar a Praça Julio Lopes pra chegar na rua Francisca Heiden, meu destino, meu ponto final daquela tarde em Bonsucesso. Dali, com a ajuda da Dra. Érika, eu faria o meu ponto de partida, minha bandeirada na guerra contra a balança. A próxima consulta está marcada para o final de março.


Até!

P.S.: A foto da balança na postagem anterior registra 129kg. Mas a Dra Érika me pesou em balança mais precisa e encontrou 127,4kg. Atribuo a perda mágica de 1,6kg durante o dia ao chope e aos bolinhos de bacalhau do Capelinha na certeza de que emoções fortes emagrecem.

19 comentários:

Anônimo disse...

Excelente Diego. A história do brinde é surpreendente. Axé ao grande Zequinha. Forte abraço


Luís Campos

José Eduardo disse...

Valeu Diego! É sempre bom lembrar de coisas boas e pessoas queridas. Gosto muito desses rituais que fazemos lembrando de alguém que gostamos.
Na foto postada de 1987 ainda podemos ver um local onde costuma ir com o meu pai: Ao Nosso Restaurante, que apesar de estar escrito churrascaria, era especializado em frutos do mar. O restaurante era muito bom e resistiu bravamente por mais alguns anos (acho que fechou no final dos anos 90), mas acabou virando uma loja da Casa & Vídeo.
Bom, como eu ainda não comecei a minha dieta, irei sábado ao Capelinha para uma justa homenagem ao vô e, assim que você puder, voltaremos juntos.
Abraços
José Eduardo

Diego Moreira disse...

Ao Nosso Restaurante era uma maravilha, né Zé?

Com o McDonalds no lugar da ELITE e a Casa&Vídeo no lugar do Ao Nosso Restaurante, a praça perdeu um pouco da sua beleza. Mas o bravo Capelinha resiste e merece a nossa visita.

vai levar um tempo mas assim que eu tiver liberado, volto lá na certa.

Henrique, que Olorum conserve meu velho em bom lugar.

Abraços!

Larissa disse...

Muito bacana essa história. Também sou fruto disso tudo, estudante do Lusoca, do Luso Carioca, da Escola Politécnica. Trabalhei na Fiocruz, no Hospial Geral de Bonsucesso... Ou seja: acho que passei mais horas da minha vida em Bonsucesso do que em outro lugar! E 50% era dentro de um ônibus da linha 902 ou 903, que passeava o subúrbio carioca! kkk Beijos

Diego Moreira disse...

É, minha irmã. Estamos juntos nessa.

Beijo!

Anônimo disse...

Caro,

se a tal dieta de chope e bolinhos de bacalhau der resultado, passarei a rezar diariamente no tal Capelinha. Com direito a missa dominical e procissões e novenas periódicas.
Bonsucesso? Com todo o respeito, você não conhece Piedade.

Abração.

Molica

Anônimo disse...

O anônimo aí de cima sou eu, Fernando Molica - é que nunca sei fazer esse negócio direito!

Diego Moreira disse...

Grande Molica,

Uma honra pra mim a sua presença nesse humilde espaço suburbano virtual.

Façamos assim, então, querido:

Marcamos um dia pra abrir os trabalhos no subúrbio da leopoldina de Bonsucesso, no Capelinha de preferência, e depois você me leva pra conhecer melhor o subúrbio da central de Piedade.

Passei muito mas parei pouco por Piedade. Vai ser bom conhecer melhor!

Lucimar, minha senhora, manda um beijo para Bárbara e eu deixo pra você o meu abraço.

Até!

Anônimo disse...

A honra é minha!

Programa: podemos acabar a festa no Engenhão, pertinho de Piedade (bem, acho que você não vai gostar desta parte).

Abraços,

Molica

Diego Moreira disse...

Que nada! O négócio é assistir futebol!

Como, no Engenhão, o jogo certamente não será contra o meu flamengo, topo assistir qualquer parada, só por amor aos certames das quatro linhas.

Mas tenho minhas quedas pelo Madureira e pelo Bangu. Se o jogo for contra eles, vou acabar torcendo contra o seu Botafogo.

Um abraço!

Arnaldo Heredia Gomes disse...

Diego,

Estou interessadíssimo em seguir esta dieta, já que tenho que perder muitos quilos.

Só tenho uma dúvida: Tenho que comer os bolinhos de bacalhau com choppe ou pode ser com cerveja?

Tenho outra dúvida. É que além de perder os quilos, preciso baixar meu colesterol. Será que caldo de mocotó ajuda?

Você pode perguntar à Dra. Érika?

Se tudo isso der certo, e vou ficar magrinho, lépido e fagueiro. E rapidinho!

Diego Moreira disse...

Arnaldo, o negócio é seríssimo, meu camarada. Dos 127,4kg já se foram 2,5kg em cinco dias de dieta.

Abraço!

Felipe Quintans disse...

Que beleza, Diego. Essa sapataria Elite é demais. Bela lembrança da Sapasso, comprei muito nela.

Abração.

Diego Moreira disse...

As duas eram as minhas favoritas, Felipinho.

Abração!

Elizabeth disse...

Diego, adorei sua história! Principalmente porque fui criada em Bonsucesso, mais precisamente na Francisca Heiden, que, na verdade, se chamou durante muuuuuuuuito tempo Francisca Hayden... Aliás, não sei porque trocaram o nome. Acho que é falta do que fazer...
Mas... não consigo atinar... Onde é o 'Capelinha'?
E onde atende Dra Érica? Numa clínica que foi aberta recentemente no lado par da rua? Gostou da consulta? Continuou vendo resultados?...rsrsrs... Desculpe-me, mas fiquei realmente interessada! Tenho tb uns kgs extras a perder...
Um abraço e sucesso!!!

Diego Moreira disse...

É isso mesmo, Elizabeth. A clínica fica no lado par da rua. Se quiser, mande-me um email (moreira1506@yahoo.com.br) que eu te envio o endereço correto e o telefone da clínica pra você marcar.

O Capelinha fica na praça mesmo. Perto da área onde os coroas jogam dama. Perto também do açougue, da ótica, da sapataria...

Se és de Bonsucesso, estás em casa! E seja bem chegada. Abraços!

Anônimo disse...

Acho legal preservar a memoria de um bairro...Bonsucesso cresceu muito graças a A.C. Mello, ha lojas boas,preços convidativos, mas o problema e a enorme quantidade de moradores de rua, pedintes, distribuidores de folhetos inuteis, sujeira permanente na porta dos bancos e grandes lojas que deveriam dar o bom exemplo, sindicos que querem se perpetuar no poder mas não querem assumir responsabilidades, imobiliarias relapsas, gananciosas, que não orientam obras urgentes descaracterizando alguns edificios feitos cuidadosamente pelo sr. Mello.

Alem disto empresas de eletrodomesticos que infernizam a vida dos moradores com som alto o dia inteiro com gerentes de ouvidos moucos, locutores apregoando mercadorias em lojas similares ou de produtos de beleza contrariando a LEi 3268/2001, kombis que param nos pontos de onibus da Cardoso de Moraes impedindo a passagem de pedestres, poças enormes que se formam em frente ao Supermercados Guanaba em dias de chuva, carrinhos de som empurrados por idosos com som altissimo contrariando o Estatuto do Idoso que circulam com chuva ou sol..Isto sem falar na escuridão no entorno da Praça das Nações e da Mello, nas ruas internas que a noite vivem vazias, nas dezenas de camelôs que se agrupam nas calçadas da Teixeira de Castro sem as minimas condições de higiene...

Duda disse...

Eu moro em Bonsucesso (na Bias Fortes)tem bastante tempo. Passo todos os dias em frente ao "Capelinha". Frequentei muito o "Nosso Restaurante". Conheci o Manuel Ribeiro, seu proprietário. Muito legal o BLOG, parabéns!!!

Flora Maria disse...

Sua postagem me fez recuar décadas e décadas no tempo...

- Morei em Bonsucesso na minha infância e juventude e emocionei-me ao ver a foto do Ao Nosso Restaurante, que pertencia ao sr. Manoel Ribeiro, primo de meu pai.
- A Sapataria Elite, que nasceu em 1948, se não estou enganada, pertencia ao meu tio.
- A Loja Modelo do Juquinha era um marco do bairro.

- Faz mais de 20 anos que não vou à Bonsucesso e, nas últimas vezes que fui, senti uma tristeza saudosa ao ver a grande mudança ocorrida por alí.

- Algumas lembranças muito antigas, para você juntar às suas herdadas da família:
1) o leão embalsamado (?) que existia no Armazém Leão, na Praça das Nações comprida.
2) As Mercearias Nacionais, na Cardoso de Morais, onde ela faz uma curvinha bem em frente à Praça das Nações redonda. Morei ali quando criança no belo edifício, que tinha as Mercearias no térreo, e que possuia uma linda porta de madeira maciça.
3) Casa Chic, um armarinho enorme e completíssimo onde se encontrava de tudo do ramo e também exibia lindas bonecas na vitrine ao lado.
Será o Capelinha nesse ponto da Cardoso de Morais, perto da extinta casa Chic ? Se for, nos meus tempos de criança ali funcionava uma loja de caldo-de-cana.
4) Olhando da Estação para a praça redonda, víamos um lindíssimo edifício de 3 andares que tinha a frente para a Praça, mas que continuava para a Guilherme Maxwell e para a Nova Iorque.
Será que ele ainda existe ?
5)Outras lojas muito tradicionais das Praças (pois considero que são 2: a redonda e a comprida):
Casa Sued, Casa das Bolsas, Sapataria Eli, O Lar Feliz, Farmácia Vitória, Cinema Paraíso, O Chepinha, Padaria do seu Belmiro, e outras que não lembro o nome. Veja que são lembranças dos anos 50,60!

Obrigada por fazer-me voltar no tempo,no meu tempo de Bonsucesso.