segunda-feira, julho 13, 2009

CADÊ O CHORORÔ DA CLASSE MÉDIA?

A tragédia é a mesma. Uma menina com cinco ou seis anos de idade caiu da janela do apartamento onde morava e morreu.

Mas a repercussão do caso da menina Rita de Cássia, ocorrido num condomínio popular do subúrbio do Rio de Janeiro, não é nem um pouco semelhante à que teve o caso anterior, o da menina Isabella Nardoni, ocorrido num condomínio de classe média-alta de um bairro rico de São Paulo.

É verdade que os pais de Rita de Cássia não são suspeitos. Ficou claro que eles deixaram a menina sozinha em casa por poucos minutos, tempo no qual se deu a tragédia. Já o pai e a madrastra de Isabella são suspeitos do caso. O mistério faz a notícia.

No entanto, a comparação entre os casos revela o classismo e o preconceito da maioria dos membros da classe média brasileira. Poucas pessoas demonstraram um décimo da comoção que demonstraram diante do caso Isabella Nardoni.



A mim parece claro: enquanto Isabella se parecia muito com as filhas da classe média brasileira, Rita de Cássia não. Enquanto Isabella morava num apartamento que lembra os apartamentos da classe média brasileira, Rita de Cássia não. Enquanto os pais de Isabella lembram os membros da classe média brasileira, os pais de Rita de Cássia não.

Que sociedade é essa que atribui maior ou menor valor à vida em função da classe social a que pertence essa vida?

Que sociedade é essa que chora, que reza, que pede missa, que leva flores a homenagear uma menina - filha de um homem suspeito de seu assassinato e de uma mulher que em vez de chorar a morte da filha foi para a internet se despedir da filha pelo orkut - e não chora, não reza, não pede missa nem leva flores a homenagear uma menina filha de pais honestos, trabalhadores e que estão claramente chocados com a morte da filha, ao contrário do casal anterior?

Que sociedade é essa?

11 comentários:

Lucimar disse...

Concordo. A menina de classe mais humilde infelizmente, de alguma forma, é vista num ambiente já marginalizado e de alguma maneira repugnante para a maioria da sociedade (não choca pois é, na verdade, repulsivo). Além do mais pensando de um modo mais abrangente... Que sociedade é essa onde as crianças estão sofrendo diversos tipos de violêcia?? Onde a violência domina qualquer espaço social (qualquer tipo de violência). Seja a classe social e a natureza da violência, a nossa sociedade precisa reformular a meneira que encara a infância. Além de nos preocuparmos com o mundo que deixaremos para os nossos filhos deveríamos nos preocupar também com os cidadãos(do futuro)que deixaremos para o mundo, quais os exemplos e modelos de moral e cidadania.

Rodrigo disse...

Cara, antes de tudo, sou seu leitor. Conheci o seu blog através do botequim do Bruno. Passei o dia inteiro com este pensamento na cabeça. Porque as pessoas não choram, não mandam flores? A violência esta tomando conta de tudo. O abandono, o descaso. Tudo se perdeu, quero acreditar ainda nas crianças, que serão adultos no amanha, e tornará este mundo menos ordinário.

Abraço

Diego Moreira disse...

Meu amor, que lucidez! Amo-te. Beijo.

Rodrigo, é isso. Eu, como educador, tento fazer o que posso por uma sociedade melhor. Nos resta ter esperança. Seja bem chegado. Abraço!

Arnaldo Heredia Gomes disse...

Pois é, meu camarada. As pessoas só conseguem se identificar com o que é igual a elas. É como se o que fosse diferente (principalmente aquilo que acham inferior) não existisse.

Anônimo disse...

Caro Diego mais uma vez você toca profundo numa questão que eu sempre digo: O Estado só existe para aqueles que possuem, e quando se mostra aos despossuídos, age de forma animalesca e fascista. E a cobertura midiática também... Morte na periferia faz parte do cotidiano ,deve ser tratado como corriqueiro e seus mortos como indigentes. Morte na Classe Média é caos,é absurdo, não pode existir!
O Subúrbio e as comunidades estão largadas as traças e isso gera uma cidade partida!O Subúrbio é tratado como o antro, e assim as relações sociais se estabelecem dessa forma. A sociabilidade no subúrbio está cada vez mais precária, e a noção de cordialidade, amizade, e de alegria, que era a alma destes bairros, está cada vez mais rara. Falo isso por que vivo essa realidade, todas as noites quando volto da casa da minha namorada na Vila da Penha para Tijuca. o trajeto já relata a desordem: a kombi que eu pego para descer na Penha é precária, o motorista dirigi sem nenhuma responsabilidade e a noção de espaço e cidadania é totalmente inexistente. Ao descer na Penha , pego um ônibus que vem de Caxias, e o seu trajeto até a Tijuca é assustador. Poucos sabem, mas há uma crackolândia no Jacarezinho, onde não existem mais seres e sim espectros. Toda noção de humanidade já se esvaiu. E não há dúvida de que ele será desumano com qulquer um para sustentar este 'estado". Ossos do ofício. Aquele que vive na barbárie e prova do seu fel, naturalmente reagirá de forma bárbara. Nesse percurso são mais de 20 Kms sem nenhum espaço de humanização... O único aparato estatal é a polícia, que é completamente desprovida de qualquer sentido de humanização. Não se tem uma atividade ostensiva, se tem uma atividade exclusivamente repressora e por que não exterminadora. E esta ausência total de humanização se reflete na atitude irresponsável e hedonista( ainda que não conscientemente) dos pais desta menina.Hedonista por que não há espaços para privações, pois neste caso é concebível na cabeça deles deixar uma criança de 5 anos dormir sozinha, para que os mesmos pudessem desfrutar mais um pouco da festa... Caro Diego nós fomos criados neste meio...Não era comum ver os nossos pais ou o pai de nossos amigos nos deixarem em casa com 5 anos de idade e continuarem numa festa. A noção de humanização ainda era existente naquela época. A mesma já dava sinais de ruptura, mas os espaços ainda permitiam um diálogo com a humanização, que permitiram que nós dois pudéssemos ter um olhar crítico sobre o mundo...Apesar de serem honestos,trabalhadores, não há como negar que há um viés de irresponsabilidade hedonista que gera um traço desumanizador...

Forte abraço,

seu cunhado

Luís Henrique

Marcelo Amaral disse...

Ninguém percebeu que, no caso Nardoni, os imprestáveis alegam que deixaram a menina (Isabella) SOZINHA MO APARTAMENTO para buscar os outros filhos na garagem (idêntico ao caso no Rio). Qual o motivo de NÃO PRENDEREM OS NARDONI POR ABANDONO DE INCAPAZ no dia da tragédia?

Uncle Bob disse...

Pois é Diego...

Você tocou num ponto interessante.

Recordo-me que por volta de 2007 várias crianças (dez ou mais) foram atingidas por estilhaços de bala no Complexo do Alemão.

Como todos eram filhos de meros trabalhadores e moradores de favelas, ficou por isso mesmo.

Cadê o Viva Rio e a guarda nacional???

Imagine se fosse um dos filhos da Fátima Bernardes ou Xuxa??

Haveria uma intervenção no Rio de Janeiro.

A dor dos menos favorecidos não comove tanto quanto a dor dos bacanas e nem vende jornal.

Filipe disse...

É isso, nego... velha política do "só me interessam os meus iguais"... Imprensa de merda, sociedade acrítica de merda.
Abraço!

Anônimo disse...

A solução para esta sociedade escrota? Só mesmo a revolução, meu camarada. Só mesmo a revolução...

Paulo Pepulim disse...

Respondo com as palavras do Mir: "Começamos com o genocídio dos índios, evoluímos para o massacre e exploração escravocrata, ascendemos ao republicanismo com segregação territorial e econômica e alcançamos o extremismo étnico e o apartheid com a modernidade. Uma estrada de horrores." A nossa sociedade é fruto disso. Esse caminho afastou qualquer possibilidade de termos uma sociedade unida, lúcida.

Parabéns pelo blog. Fui seu aluno no PH em 2007.
Grande abraço.

Paulo

Diego Moreira disse...

Meu muito obrigado a todos que comentaram aqui: Lucimar, Rodrigo, Aranaldo, Luis Henrique, Marcelo, Roberto, Filipe, Bruno e Paulo.

Um forte abraço!