quinta-feira, maio 22, 2008

SOBRE ESTES TEMPOS MENOS INTERESSANTES

Das reflexões que tenho feito em meus cada vez mais raros momentos disponíveis para a introspecção, aquela acerca dos (des)caminhos da sociedade e do mundo contemporâneos é a que me inspira mais fortemente a desolação no espírito. Definitivamente são menos interessantes estes tempos em que vivemos.

A mente humana, movida por um desejo ou um sonho, é capaz de produzir avanços incríveis nos mais diversos setores da vida, como na medicina, na engenharia, nos direitos humanos, nas tecnologias para o consumo, nas comunicações e nos transportes - que hoje sugerem a formação de uma aldeia global, de uma cidadania planetária. Mas, também, movida por um desejo ou um sonho, ela é capaz de produzir a guerra - e todas as violências que a acompanham e a motivam, como o egoísmo, o ódio, o racismo, a segregação e a ganância - sugerindo que mesmo em um mundo globalizado, a cidadania plena de um indivíduo pode, eventualmente, encontrar abrigo somente dentro do próprio ser.

Não creio que a mente humana possa ser analisada e interpretada de um ponto de vista maniqueísta como este já que ninguém é totalmente bom ou ruim. Somos complexos. Mas o que me espanta e, sinceramente, me incomoda, é saber que a mente humana escolhe, nos dias atuais, o aprisionamento em detrimento da liberdade do próprio ser. E no centro da cadeia de elementos que prendem os homens deste tempo estão algumas das tecnologias produzidas pela mente humana, que não cessa de desejar e sonhar.

Poucas coisas podem ser mais nocivas para as relações pessoais do que a internet. Milhões de pessoas são capazes de buscar amizades e contatos em sites de relacionamentos, mas são incapazes de fazer uma amizade a partir de uma circunstância do cotidiano. São capazes de escrever depoimentos repletos de elogios e declarações de amor para os amigos, mas são incapazes de olhar nos olhos desses mesmos amigos e dizer do seu carinho, da sua amizade. Pouca gente diz hoje "eu te amo" para um amigo, cara a cara, tête-à-tête, como se isso fosse algo constrangedor.

A preferência pelo virtual parece clara quando se entende que este novo mundo possibilita ao ser forjar-se da maneira que mais lhe apraz. Ele permite a construção de uma persona através de imagens que podem ser manipuladas e da exibição de afinidades com pessoas, ídolos, hábitos e memórias como - "tocava a campainha e corria...", ou "odeio festa junina..." etc. Neste mundo, cada um pode ser o que quiser, o que sonha, o que deseja ser, ao contrário do mundo real, onde cada um é o que realmente é, e a mudança, a metamorfose para tornar-se o desejado, exige esforço. E esforço é o que os homens dessa sociedade cheia de soluções rápidas e práticas não suportam.

As pessoas são, e estão cada vez mais, carentes. É compreensível, então, que na internet - onde não importa o que somos mas o que parecemos ser - a criação uma persona em que pareçamos ser melhores do que realmente somos, seja uma estratégia adotada por cada vez mais pessoas. Vejo que é das carências humanas que surge a necessidade que as pessoas têm de se igualarem. O Objetivo é evitar a exclusão, que leva o ser ao extremo de suas carências e frustrações, e, por isso, temos cada vez mais pessoas inseguras e deprimidas, em uma sociedade cada vez mais alopática.

Os adolescentes, metamorfoses ambulantes, são os que parecem mais sofrer com esse processo. Inseguros por natureza, com libido em transe e ainda contaminados com o maniqueísmo do mundo infantil, tendem aos extremos nesta fase da vida. Ou igualam-se totalmente ou excluem-se totalmente para fugir das exclusões impostas pelos outros.

Dentre os que se igualam nota-se que todos buscam o mesmo estilo para roupas, cabelos e calçados. Compartilham entre si os vídeos engraçados do YouTube, - e ai de quem não assistir! - preferem falar com os amigos pelo msn ou pelo orkut do que pelo telefone, ouvem insistentemente seus mp3 e iPods, alheios ao mundo que os cerca, só se encontram na escola ou no shopping e fazem uma tremenda zona no cinema, ignorando os prazeres possíveis da sétima arte e, claro, achando que isso é o máximo. Não são livres, embora pareçam, com suas ações baderneiras. São escravos da própria insegurança, assim como os que se excluem tentando diferenciar-se. Estes não são mais livres do que os outros pois é no fundo a mesma insegurança e o medo de serem excluídos que motiva-lhes o distanciamento.

Para os dois grupos, a situação é ainda mais complicada quando complementada por mais um triste fator: ou eles não amam seus pais ou não são amados por eles, para quem os filhos representam âncoras que impedem o avanço da embarcação do sucesso financeiro.

Para alguns, a insegurança da adolescência não passa, e até aumenta com o tempo. Homens e mulheres recordistas em cirurgias plásticas não reconhecem o poder do tempo e da gravidade. Malham o corpo e não exercitam a alma, ignorando princípios como a solidariedade. Não raro tem-se o desprazer de ouvir a conversa de um adulto(?) com outro(?) através do NexTel. Aquele barulho em pleno transporte público, além de inconveniente e irritante, é fruto de uma tremenda necessidade de chamar atenção. Pra Freud, a explicação pra isso deveria ser muito simples: como os infelizes não podem fazer uma demonstração fálica em público - até porque esses manés só podem ter o pau pequeno - eles materializam seu desejo fazendo aquele barulho com o NexTel.

Vivemos cercados. Somos constantemente seqüestrados pelas mídias e pela propaganda, o que torna essa sociedade de consumo mais perversa do que já é posto que a base maior da sua perversidade não vem deste assédio mas da exclusão social que sustenta esse sistema. Cabe a nós escolher entre deixar-nos levar nesse seqüestro, tornando-nos reféns das mídias e da indústria cultural, ou resistir ao assédio e optar pelo que me parece muito mais interessante: a conversa em família, o papo com os amigos, o futebol no campinho da esquina, a cerveja gelada no buteco, o churrasco na laje... Por inventar e reinventar a vida. Real.

2 comentários:

Larissa disse...

Diego,

Commpreendo e compartilho das idéias expostas aqui, quase em desespero. Também tenho "medo do escuro", por isso procuro ser aceita para não ficar só, e sou mais uma das pessoas carentes que citou.

Porém, acredito que o resgate das coisas simples da existência também acontece. Sempre ouço as pessoas falarem que querem mais tempo para si mesmas, para cuidar dos filhos. Querem diminuir o ritmo, para curtir o prazeres como ler um livro, viajar para o campo, cuidar do jardim, almoçar com amigos. Isso não exclui o que a tecnologia nos oferece de positivo, como a troca de informações de forma ágil, as amizades pela internet. Também há algo positivo nisso, o que é justamente querer que as relações aconteçam para além da tela. Vou postar algo para você lá no Trivial. Esse assunto é importante. beijos!

Diego Moreira disse...

É isso aí, garota. A diferença entre o remédio e o veneno está na dose. Internet, mp3, iPods, tudo isso pode ser bacana, se não tomar conta da vida das pessoas, como ocorre com muita gente nos dias de hoje.

Beijo!