quarta-feira, fevereiro 27, 2008

SUBVERTENDO A ORDEM EM IPANEMA

Quando publiquei o texto Merda em Ipanema – leia! na quarta-feira passada, sentando o cacete, como deve ser feito nesses casos, numa lojinha de sucos que pretende se passar por chic estampando umas notinhas de jornal atrás do balcão, fiz a seguinte promessa:

"Mas eis que eu, que agora tenho uns bons intervalos entre as aulas ali, estou determinado a garimpar e mapear - como um bom geógrafo deve fazer - os pontos com cara de subúrbio no tal quadrilátero chic. (...) Não terminei o lanche. Saí e me arrependi de não ter entrado no pé sujo clássico que descobri ao lado da espelunca vendedora de sucos que pretende ser chic estampando tais notinhas abjetas. Na próxima eu vou ao pé sujo. E conto aqui pra vocês sobre o primeiro espaço suburbano do quadrilátero sofisticado de Ipanema que devassarei na próxima semana."

Promessa é dívida. Pesquisei sobre esse troço de quadrilátero chic e acabei encontrando uma série de páginas na internet sobre o espaço que a turma do nariz em pé chama de Quadrilátero do Charme - que nojo! - que é formado pelo espaço que vai da rua Joana Angélica até a Aníbal de Mendonça, desde a Lagoa Rodrigo de Freitas até a Praia de Ipanema.

Animado em mapear os enclaves com cara de subúrbio no tal quadrado, ou espaços off-charm, como preferem os bambis saltitantes da Farme de Amoedo, fui, durante o meu intervalo, em direção ao tal pé sujo que fica ao lado daquela espelunca vendedora de sucos execravelmente divulgada - duvido que tenha sido de graça - pelo Joaquim Ferreira dos Santos. Veja a foto com o quadrilátero destacado e a localização do Bar.


É, exatamente, pra subverter essa ordem patética e classista que segrega os espaços por condição social e poder de consumo, que resolvi vasculhar e revirar de cabo a rabo o território e mapear, um a um, os pontos que não tem nada de sofisticado ou charmoso no ponto de vista dessa gente que quer embalar-se no modo de vida europeu aqui nos trópicos.

Cheguei, então, no Bar Sabugosa. É esse aí, ó. Ninguém diz que esta encravado no quadrilátero do Charme.

Notei, de cara, uma bela carne assada exposta no balcão. Apontei pra dita cuja e perguntei pro camarada que trajava um tradicionalíssimo jaleco azul:

- Sai, com um pão?

- É pra sanduiche, porra! - foi o que ele me respondeu com o "porra" dito baixinho, entre os dentes.

- Então, manda!

Dito e feito. Provei o sanduiche com refrigerante - já que estava trabalhando - e comprovei que era justíssimo o meu arrependimento da semana passada, quando paguei preço de almoço num lanche horroroso, na companhia do "Gente Boa" (nunca será!) d`O Globo.



Enquanto a visão atrás do balcão na loja de sucos é o Joaquim Ferreira dos Santos e suas notinhas abjetas, no Sabugosa a visão é muito mais bonita e familiar pra um suburbano como eu. Saca só!




E mais. Enquanto eu fui obrigado a pagar pela ficha no caixa antes de comer na lojinha de sucos, no Sabugosa eu sentei no balcão, comi, bebi, e quando abri a carteira, vi que não tinha nenhum real pra pagar pelo lanche. Problema? Não. Expliquei rapidamente a situação pro camarada, fui ao banco, saquei o dinheiro e voltei pra pagar a dolorosa. Sem reclamação nem mumunha vinda de trás do balcão. Troço valoroso. O Sabugosa é, definitivamente, um contraponto necessário ao classismo pequeno-burguês do Quadrilátero do Charme.

Inté!

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

AQUELA TAL MALANDRAGEM

Malandro é malandro, e mané é mané! Quem espera tempo bom é sertanejo. Otário sempre vacila. Entra na roda e dança. Mas malandro de verdade é quem tem autoridade pra dizer: "formiga miúda não morde o meu pé".

Explico.

Tem situações que deixam muita gente sem saber ao certo o que fazer. Histéricos não fazem nada. Só alarde. Metidos a sabichões costumam fazer merda e piorar o que já estava ruim. E daí pode-se provar que malandro é malandro, e mané é mané.

Minha mãe é daquelas cozinheiras de mão cheia, e eu já disse e reafirmo isso aqui. Instalada aqui em casa nesses dias, a velha foi ao fogão armar um refogado esperto pro jantar, mas escorregou no sal. Quem espera tempo bom é sertanejo... Mas pra ela isso é formiga miúda. Chego na cozinha e dou de cara com essa cena no fogão:

- O que é isso, velha?

- Acho que eu salguei o refogado. Mas a minha mãe me ensinou que colocar sal por cima da tampa da panela faz ele puxar o sal da comida. Tira o excesso.

Senti-me criança descobrindo o segredo de uma grande mágica.

- Meu celular, onde está? Vou fotografar! - disse.

- Há! Mas, Diego... - ela disse, e soltou uma de suas gargalhadas.

E as gargalhadas da minha digníssima genitora são de dar inveja em um time completo de pombas-giras, com dona Maria Padilha, dona Mulambo, Pomba-gira das Sete Encruzas, Pomba-gira do Fogo e mais, todas elas conhecidas de longa data, de minha mãe e do seu Zé Pilintra, o maior malandro de todos os tempos, símbolo máximo da Lapa, daquela tal malandragem, que a boca-pequena diz que não existe mais, mas que reviveu nesse fim de tarde aqui em casa.

Vazei, que eu não marco bobeira.

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

MERDA EM IPANEMA

Trabalho em Ipanema às terças e quartas. Gosto. Nunca tive problemas por lá. Muito pelo contrário. Foi ali que entrei em sala de aula pra ensinar geografia pela primeira vez. E deu certo. Muito certo. E lá se vão quatro anos.

Em plena Garcia D´Ávila, no quadrilátero mais sofisticado da cidade - e isso é o que me desagrada por lá - fica meio difícil pra um suburbano encontrar boas opções próximas. Mas eis que eu, que agora tenho uns bons intervalos entre as aulas ali, estou determinado a garimpar e mapear - como um bom geógrafo deve fazer - os pontos com cara de subúrbio no tal quadrilátero chic.

Do começo. Cafézinhos literários, Bistrôs de não sei o que, Lounges de não sei o que lá, definitivamente combinam com Ipanema e não com o Subúrbio. Até o que não é pra ser sofisticado parece querer ou finge ser sofisticado ali. Entrei hoje numa loja de sucos - que não divulgo o nome nem na base da porrada, que isso aqui não é agência de marketing, mas indico a esquina: Pirajá com Maria Quitéria. Pedi um suco de laranja e o sujeito me mandou pegar a ficha.

Até aí tudo bem. Se bem que no Subúrbio eu comeria qualquer coisa no balcão e pagaria na saída, mas... vamos em frente. Pedi também um sanduíche. Paguei e encostei a portentosa barriga no balcão pra, enfim, fazer meu desjejum. Uma dentada e um gole. Olho pra parede atrás do balcão e vejo algo que me deu mais nojo do que teria se tivesse visto uma barata cascuda passeando tranquilamente.

Eram duas ampliações de notas do Joaquim Ferreira dos Santos na coluna Gente Boa do lixo editorial conhecido por O Globo. Uma relatando a fortuita presença de celebridades gringas naquele recinto e a outra pedindo o tombamento de um sanduíche da casa como patrimônio da cidade. Tudo em meio a exaltações babacas à pretensa superioridade de Ipanema.

Não terminei o lanche. Saí e me arrependi de não ter entrado no pé sujo clássico que descobri ao lado da espelunca vendedora de sucos que pretende ser chic estampando tais notinhas abjetas. Na próxima eu vou ao pé sujo. E conto aqui pra vocês sobre o primeiro espaço suburbano do quadrilátero sofisticado de Ipanema que devassarei na próxima semana.

Inté!

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

ELE NÃO PODE MAIS DEMORAR

No último dia 12 de agosto, dia dos pais, meu velho avô Zequinha encantou-se, tendo a Natureza, subtraído-lhe o sopro da vida. Perdi, sem nenhuma dúvida, a maior referência de bom-senso, integridade e respeito ao semelhante que tive até hoje em minha vida. Tristeza profunda em relembrar os momentos de acalanto na infância e saber-me inevitavelmente carente deles para o resto dos meus dias.

Não faz um mês que, na véspera do dia de São Sebastião, meu sogro, o velho Mizoca, também foi levado por um infarto que fez seu peito calar. Perdi, então, uma referência intelectual daquelas que nos fazem desejar estar sempre por perto na ânsia por saber mais, conhecer mais, experimentar, viver e ser. Produzir o nosso "eu" de uma maneira mais consistente e mais livre.

Eis que nas últimas horas, por desígnios do Alto, mais uma vida que me cercou desde o início dos meus dias encontrou a encruzilhada pela qual todos passaremos. Na infância, sempre soube-lhe ser um querido tio, sem laços sanguíneos, que tinha por missão fazer mágica nas vidas das pessoas. Inclusive na minha, cuja preocupação nos tempos de escola era somente ir bem nas provas e passar de ano. Pra isso nunca faltou uma balinha e a cordial orientação pra que batesse meu pé direito três vezes e chamasse meu amigo "preto que brilha", pra me ajudar nas perguntas difíceis. Sempre funcionou.

Cresci sabendo-lhe ser um avô, na medida em que a idade avançava. E era a isso que ele mais se assemelhava nos últimos anos, quando pudemos acompanhá-lo mais de perto. Nesse tempo, não houve sequer um momento em que encontramos suas portas fechadas. Sempre abertas para todos, elas permitiam ver que em seu peito, o que pulsava não era uma pedra e sim uma flor, leve e clara, como sua alma.

Mas foi uma pedra, uma Pedra Preta, que guiou seus caminhos até aqui, desde a mais tenra idade Capixaba, em Cachoeiro do Itapemirim, estando presente em seus caminhos na Mangueira, em São Cristóvão, Manguinhos, Ramos, na Penha e em Vista Alegre, onde seus filhos, tristes, se despediram desse encantado Ser da Natureza Divina, que espalhou bondade, complacência, justiça, caridade, cura e fé a milhares de pessoas durante sessenta anos de história. E agora está guiando seu filho mais dileto ao seu lugar de direito, que é estar sentado aos pés de Oxalá.

Minha consciência diz que perdi, desta vez, a maior referência de espiritualidade que já tive em minha vida. Aquele que me fez sentir a presença de Deus, de forma tão profunda quanto inquestionável, tão intensa quanto suave. Isso não tem preço. É de valor inestimável, assim como tudo o que ele nos ensinou, que é exatamente o que nos fortalece, agora. Afinal, segundo ele mesmo, ao contrário do que eu disse até aqui, nós não estamos perdendo ninguém. Estamos devolvendo ao verdadeiro Dono.

E é daí também que sabemos que seria de um egoísmo profundo desejar a sua permanência por mais tempo neste orbe, sabendo que seu estado físico já não lhe permitia andar, agir e se comunicar livremente, como pôde fazer ao longo de sua vida. Seria um fardo pesado demais para um espírito tão leve e que fez por não merecer tamanho sofrimento.



Diante disso, tenho a exata noção de que ele faz agora uma jornada para a liberdade do espírito, longe das dores, na certeza do dever muito bem cumprido, na merecida paz. E que despede-se de nós e dessa personalidade que assumiu nesses quase oitenta anos de existência terrena, cantando sua canção anunciada para o adeus:
“Adeus madrugada de hoje.
Não posso mais demorar.
Adeus, Umbanda.
Não posso mais demorar”.
Sua bênção, Bàbá.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

CARNAVALESCAS PÓSTUMAS

Tivesse eu um trabuco no meu armário, tinha enfiado umas quinze azeitonas nos miolos da Ivete Sangalo. Pena que eu ia explodir a minha televisão. Eita cabrita chata! Pega leve é o escambau!

Inté!

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

RECESSO NECESSÁRIO

É tempo de dar uma parada pra não pensar. Pra esquecer o que foi e o que virá. Mas na folia desse ano, só não conseguirei esquecer, a heresia cometida pela escola que fez meu peito bater em verde-e-rosa durante todos esses anos, por, agora, no centenário de um dos seus maiores bambas, fabricar um enredo patético e injustificável, bancado por um patrocínio interessado nos retornos financeiros via turismo que a visibilidade dessa grande agremiação pode proporcionar.

Uma escola não deve pisar sobre a sua tradição e nem esquecer os heróis que honraram o seu estandarte. Mas não foi assim, infelizmente, na mangueira, que se vendeu - aliás, algo cada vez mais comum nas grandes escolas - por uns torcados.

É por isso que, nas últimas semanas, tenho ostentado a imagem do Mestre Cartola, numa homenagem singela a esse monstro da música brasileira que, provavelmente, lá de cima, com o peito vazio, tem dúvidas se o Sol nascerá para sua escola, sai de fininho, disfarça e chora.

Volto depois da quarta cinzenta.
Inté!